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Projeto Mediação e Educação em Museus: Novos Olhares

Resumo

O texto é um relato da equipe do Núcleo Educativo MIS sobre o “Novos Olhares”, projeto desenvolvido pelo Museu da Imagem e do Som (MIS) de São Paulo que teve sua primeira edição em junho de 2017. Procuramos aqui esmiuçar as origens do projeto e desenvolver uma reflexão sobre o seu possível impacto na prática educativa da instituição realizadora e nos educadores participantes.

Palavras­‑chave

Mediação cultural; Arte­‑educação; Museus; Centros culturais.

A escuta do outro pressupõe que consideremos, além de nosso próprio entendimento das situações vividas, outras perspectivas trazidas por pessoas que podem entender a realidade dada de diferentes ângulos. Norteados por essa ideia, que é uma máxima da linguística aplicada à Educação, o Educativo MIS desenvolveu o projeto “Novos Olhares”, que buscou conhecer o discurso dos educadores em exercício em diversas instituições culturais brasileiras. Este texto é um relato de como essa experiência se desenvolveu.

No início de 2017, o Núcleo Educativo MIS recebeu 10 mil reais do Prêmio Darcy Ribeiro, promovido pelo Ministério da Cultura por intermédio do Instituto Brasileiro de Museus (Ibram), como reconhecimento por um dos projetos desenvolvidos pelo setor, o Hyperlink. O prêmio deveria necessariamente ser investido na formação da equipe, como constava no edital da premiação: “o valor recebido pelo prêmio deveria ser empregado exclusivamente nas ações e projetos educacionais dos museus, seja no próprio projeto concorrido ou em outras práticas e ações de educação museal”.

A norma expressa no edital abriu uma série de discussões entre os educadores; num primeiro momento, pensamos em um ciclo de palestras, onde discutiríamos com especialistas de diferentes áreas os temas tradicionais da educação não formal. Em reuniões conjuntas entre os educadores, a ideia original foi ganhando outro corpo e emergiu a vontade de ouvir outros profissionais que lidam com a prática educativa de forma cotidiana, na sua rotina profissional. Começamos então a elaborar um edital que nos permitisse ouvir esses profissionais sobre temas norteadores que julgamos fundamentais para conceituar a rotina desse trabalho nas instituições culturais. Em vez de convidar educadores, entendemos que seria mais efetiva a abertura de um edital por meio do qual pudéssemos conhecer um pouco dos trabalhos desenvolvidos antes de uma possível apresentação. Um dos pontos importantes desse edital foi a possibilidade de inscrição para educadores, monitores e orientadores, ou seja, todas as variáveis da profissão que encontramos hoje nos museus.

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A ideia de ouvir profissionais atuantes na área surgiu após uma série de visitas a outros museus, realizadas nos primeiros meses de 2017. Essas visitas nos apresentaram pequenas soluções para dificuldades que também enfrentávamos. As instituições visitadas foram Museu Afro Brasil, MASP, Ema Klabin, Tomie Ohtake e Museu Paulista, onde tivemos trocas mediante conversas espontâneas que nos permitiram dividir dificuldades do nosso trabalho, algumas relacionadas a questões arquitetônicas – que trazem implicações para os grupos com dificuldade de locomoção, por exemplo – ou a ausência temporária de um prédio, como é o caso do Museu Paulista, e a necessidade de continuar o trabalho ainda assim. A riqueza dessas trocas germinou a vontade de ouvir outros educadores falando sobre seu cotidiano profissional de uma maneira que outros profissionais da área também pudessem acompanhar.

Um dos pontos mais importantes discutidos pela equipe, durante a elaboração do edital, foi ouvir quem tem prática profissional de atendimento de grupos, deixando de fora coordenadores ou ainda quem desenvolve pesquisa na área, mas não tem atuação prática. Apesar de reconhecer a importância das sistematizações e reflexões oriundas da pesquisa acadêmica, acreditamos que esse espaço de debate encontra­‑se em certa medida garantido, ao passo que o educador conta exclusivamente com seu setor educativo para traçar reflexões aprofundadas sobre seu trabalho. Por julgar que a pesquisa é intrínseca a nosso trabalho, procuramos garantir o reconhecimento do educador como tal.

Um dos fatores de interesse no desenvolvimento desse projeto foi a relação que o educativo passou a ter com setores e funções variados. Um dos exemplos disso foi a constante consulta ao jurídico para elaborar o edital ou a atuação na produção, já que durante a fase de execução foi necessário pensar horários, espaço e divulgação, entre outros elementos que tradicionalmente não compõem nosso escopo de trabalho.

Nosso trabalho começou na confecção do edital: era preciso delimitar nesse primeiro documento quais temas gostaríamos de aprofundar durante os encontros. Em reuniões com toda a equipe, concluímos que em uma primeira edição nos interessava tratar de temas clássicos da educação não formal, assim, selecionamos estes temas: acessibilidade, relação museu­‑escola, desenvolvimento de material educativo, mediação, artista mediador e atendimento ao público de museu, este último como uma forma de não limitar o que poderia surgir.

Foram recebidos 45 projetos para análise, dentre os quais precisávamos selecionar 16. Desenvolvemos uma metodologia de seleção que privilegiava a diversidade de projetos apresentados, a relevância do tema para nosso educativo em particular e a possível apropriação da questão por diferentes instituições. Todos os educadores que compõem o setor votaram, e conseguimos chegar aos 16 projetos. É importante ressaltar a qualidade dos textos recebidos, um dos motivos que nos levaram a pensar o Novos Olhares como programação anual fixa do Educativo MIS.

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A partir dos projetos selecionados começamos a pensar nos melhores diálogos entre eles e na maneira de compor as mesas, para que o público conseguisse se organizar segundo seus interesses. Dessa triagem saiu esta divisão: Profissionalização e desafios na formação de educadores de museu; Ações Extramuros; Estratégias de Mediação e Educativos e Parcerias Institucionais.

Apresentamos aqui a composição das mesas com um breve descritivo do tema e currículo dos selecionados:

Mesa 1 – 5 de junho de 2017

PROFISSIONALIZAÇÃO E DESAFIOS NA FORMAÇÃO DE EDUCADORES DE MUSEUS

Website educar com patrimônio: blog desenvolvido com a finalidade de produzir conteúdo sobre educação patrimonial, educação em museus, arte, história e assuntos relacionados.

Bruno Marinho: graduado em História pela Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop) e pós­‑graduado em Gestão Cultural pelo Centro Universitário Senac. Atua como educador em museus no estado de São Paulo desde 2015.

A prática na realização de pesquisas de público e a potencialidade de análise das ações do educativo pautadas na coleta dos dados: projeto fala da importância da coleta de dados e de sua utilização para melhorias nas ações dos núcleos educativos.

Juliana Barros: graduada em Artes Visuais pelo Centro Universitário Belas Artes de São Paulo, atua como educadora no Museu da Imigração (São Paulo) desde 2014.

A postura do educador diante dos contextos sociais: mediante pesquisa autônoma, a educadora investiga a relação entre arte­‑educadores diante de grupos étnicos e raciais variados.

Mona Perlingeiro: licenciada e bacharela em Ciências Sociais pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), atua como educadora em espaços culturais desde 2012.

Mediador cultural: as condições de trabalho e suas implicações: o projeto investiga em que medida as condições de trabalho oferecidas pelos equipamentos culturais da cidade de São Paulo interferem na prática do mediador cultural.

Cintia Masil: mestranda em Artes pela Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (Unesp), bacharela em Artes Visuais pelo Centro Universitário Belas Artes. Atua como educadora desde 2009 em diversos espaços culturais na cidade de São Paulo.

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Mesa 2 – 12 de junho de 2017

AÇÕES EXTRAMUROS

Sonoricidades: utilizando a paisagem sonora de diferentes bairros, instalação sonora desenvolvida com o público buscava levantar questões relativas à imigração.

Conrado Secassi: graduado em Artes Visuais pelo Centro Universitário Belas Artes, com pós­‑graduação em Estudos Brasileiros, atua em educativos da cidade de São Paulo desde 2006.

Um dedo de prosa: conversas literárias – projeto desenvolvido com o objetivo de atender o público de terceira idade que reside em instituições de longa permanência.

Flávia Violim: graduada em Letras pela Universidade Cruzeiro do Sul (UnicSul) e pós­‑graduada em Psicopedagogia pela mesma universidade, é educadora no Museu Casa Guilherme de Almeida desde 2013.

Inter_mediação continuada: educador relata o acompanhamento de um mesmo grupo com que trabalha na favela do Jaguaré a exposições em diversos museus na cidade de São Paulo.

Guilherme Minoti: graduado em Artes Plásticas pela Universidade de São Paulo (USP), onde atualmente cursa Filosofia, foi premiado pelo ProAC Artes Visuais em 2015 com o projeto “Voo da Mariposa”. Atuou como educador no Museu de Arte Contemporânea (MAC­‑USP), e desde 2014 é professor artista mediador na Casa de Maria e Marta.

Diálogos étnico­‑raciais: projeto apresenta material educativo desenvolvido com a finalidade de troca de experiências sobre as relações étnico­‑raciais presentes na história do Brasil.

Juliana Correia: cursa Filosofia na Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e realiza estágio no Sesc desde 2016.

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Mesa 3 – 19 de junho de 2017

ESTRATÉGIAS DE MEDIAÇÃO

Figura 1 – Foto: Paulo Koba.

Jogos educativos como ferramenta para o educador: apresenta­‑se um jogo desenvolvido pelo educativo do Museu do Futebol, no qual os educadores utilizam um mapa das torcidas brasileiras, trabalhando conteúdos escolares em paralelo ao tema do museu – o futebol.

Angélica dos Santos Ângelo e Laís Oliveira Araujo Neves: projeto apresentado por duas educadoras do Museu do Futebol. Angélica é licenciada em Língua Portuguesa e Inglesa pela PUC­‑SP, Laís é formada em Sociologia e técnica em Museologia, e atualmente cursa gestão pública na Universidade Cruzeiro do Sul (UnicSul).

Museu vai à escola: projeto desenvolvido em parceria com a Escola Estadual Ministro Costa Manso (São Paulo), trabalha o tema das migrações contemporâneas junto à disciplina de Atualidades.

Guilherme Ramalho e Isabela Maia: educadores do Museu da Imigração (São Paulo), Guilherme é formado em Comunicação Social e trabalhou em diversas instituições culturais de São Paulo, entre elas a Fundação Bienal, o Museu da Cidade e a Pinacoteca do Estado. Isabela formou­‑se na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e já trabalhou no Museu de Arte Brasileira (MAB/FAAP), no Instituto Tomie Ohtake e na Zebra5 – Jogo e Arte.

Museu: formas de usar: projeto desenvolvido na Fundação Ema Klabin para discutir os possíveis usos do museu casa. A partir de uma conversa disparadora, os visitantes atribuíram novas funções e formas de uso para o museu.

Paloma de Almeida Durante: formada em Artes Visuais pelo Centro Universitário Belas Artes, faz parte do grupo de estudos práticos em linguagem experimental e ministra oficinas de escrita experimental. Atuou como educadora em diferentes instituições, entre elas a Fundação Bienal e a Fundação Ema Gordon Klabin.

Apontamentos e reflexões sobre estratégias educativas no Museu de Arte do Rio (MAR): projeto que investiga a produção bibliográfica sobre a relação museu­‑educação, para entender o papel de setores de educação em museus de arte e suas estratégias de inclusão de diferentes públicos.

Renata Maneschy Teles de Freitas: graduada em Museologia pela Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UniRio) e pós­‑graduada em ensino de artes pelo Parque Lage e pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), trabalhou como educadora e assistente de museologia em instituições culturais do Rio de Janeiro.

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MESA 4 – 26 de junho de 2017

EDUCATIVOS E PARCERIAS INSTITUCIONAIS

Diálogos instigantes: trocando ideias sobre educação, artes visuais e literatura, o projeto tem como intenção a instrumentalização de educadores da área formal e não formal com referências teóricas e reflexões práticas.

Sidnei Vieira: bacharel em Artes Visuais pelo Centro Universitário Belas Artes de São Paulo, atua como educador no Museu Casa Guilherme de Almeida desde 2014.

Memórias e vínculos entre o museu e a cidade: projeto que aborda o impacto de Inhotim no contexto de Brumadinho (MG) e as ações educativas voltadas à aproximação do museu com a cidade.

Anderson Barbosa: atuou como educador em Inhotim, onde desenvolveu esse projeto. Trabalha hoje no Museu da Cidade (São Paulo).

Construção da memória pela Contação de História: projeto desenvolvido em parceria entre o Memorial da Resistência (SP) e o CECCO Bacuri, engajava visitantes e educadores em pesquisa de fontes e criação coletiva de uma história a ser contada.

Daniel Gonzales: formado em História pela Universidade de São Paulo (USP), trabalha com ensino desde 2003. Foi ator e é hoje educador do Memorial da Resistência (SP), onde desenvolve projetos voltados ao público com deficiências.

Um pé em cada canoa: fluxos entre museus e escolas: projeto de pesquisa desenvolvido no Instituto de Artes (IA) da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (Unesp), busca compreender o papel do professor na formação de público de museus.

Diana Tubenchlak: formada em Educação Artística pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), pós­‑graduada em linguagens artísticas na Faculdade Santa Marcelina (SP) e mestre em desenvolvimento na Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (Unesp), atua com um pé em cada canoa: professora de artes no ensino formal e arte educadora em instituições culturais de São Paulo.

Figura 2 – Foto: Paulo Koba.

As mesas aconteceram sempre às segundas­‑feiras, para facilitar o acesso do maior número possível de profissionais de museus. Com base na programação, foi possível notar que houve grande variedade de perfil entre os educadores, o que possibilitou pluralidade entre os temas abordados e garantiu o interesse de um público amplo.

Avaliação

Internamente, a equipe avaliou positivamente o evento. Julgamos que a norma explícita no Prêmio Darcy Ribeiro foi alcançada, ou seja, o diálogo com outros educadores provocou reflexões sobre nossa própria prática, além de apresentar ferramentas de trabalho possíveis, como no caso dos jogos e a incorporação de novos discursos à nossa fala. O público externo ao Educativo MIS também avaliou, no preenchimento de formulários que enviamos por e­‑mail, a relevância do evento. Constatamos a partir desses formulários que a maioria dos participantes acompanhou mais de uma mesa e considerou que seria interessante uma segunda edição do evento.

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Ressaltamos que, além de ser relevante para a formação profissional de diferentes educadores, o encontro possibilitou um espaço de socialização importante para uma classe que tem na rotatividade de locais de trabalho uma de suas características mais marcantes.

Além da avaliação da equipe, houve presença constante do mesmo público e resposta favorável mediante preenchimento dos formulários, assim o “Novos Olhares” conseguiu expandir seus próprios limites graças aos educadores participantes. No evento destinado a esse público, organizado anualmente pela Secretaria de Cultura do Estado de São Paulo, a educadora Cintia Masil – que havia apresentado uma das mesas mais comentadas (Profissionalização e Desafios na Formação de Educadores de Museus) – foi convidada a falar em resposta ao pedido dos educadores que trabalham em museus subordinados a essa Secretaria, em consulta prévia.

O “Novos Olhares” passou a fazer parte do plano anual do Museu da Imagem e do Som (MIS) como programação fixa do setor educativo. Em resposta aos apontamentos do público participante em 2017 pretendemos preencher algumas lacunas, como a divulgação do registro audiovisual e o lançamento de uma publicação que permita ao educador não apenas apresentar seu trabalho de forma sistematizada em uma palestra, mas também ser sujeito da produção teórica acerca de sua profissão.

Capa

Rede de Redes – diálogos e perspectivas das redes de educadores de museus no Brasil

Sumário Ficha Técnica